Execução Penal: Contagem da pena em dobro
Eu costumo dizer que quem não acompanha a jurisprudência dos Tribunais Superiores, sempre estará um passo atrás no mercado da advocacia criminal.
Meu nome é Cris Dupret, sou advogada criminalista na área consultiva, especialmente em Execução Penal e presidente do IDPB.
Coordeno o Curso Decolando na Execução Penal do IDPB, que prepara estudantes e advogados em todo o Brasil, capacitando-os para a atuação na Execução Penal, transformando a vida de centenas de profissionais. E no curso, os alunos têm acesso a um amplo banco de jurisprudências e modelos de peças que facilita e muito a vida dos advogados iniciantes neste nicho super promissor.
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Contagem da pena em dobro
Se você acompanha a jurisprudência dos tribunais, sabe que em maio de 2021, ministro Reynaldo Soares da Fonseca do STJ concedeu habeas corpus para que fosse contado em dobro todo o período em que um homem esteve preso no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Complexo Penitenciário de Bangu, localizado na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Em 18 de junho de 2021, o STJ publicou notícia sobre decisão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou recurso do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e confirmou decisão monocrática do ministro Reynaldo Soares no HC 136961.
Hoje, quero trazer os pontos principais dessa importante decisão e como ela pode favorecer o seu cliente da execução penal.
Decisão inédita aplicando o princípio da fraternidade
De forma inédita, a Turma criminal do STJ aplicou o Princípio da Fraternidade para decidir pelo cômputo da pena de maneira mais benéfica ao condenado que é mantido preso em local degradante.
Portanto, a decisão caracteriza um importante precedente possível de ser aplicado para a resolução de situações semelhantes.
No caso concreto, o ministro João Otávio de Noronha observou que o voto “consagra um princípio já agasalhado na Constituição Federal [o Princípio da Fraternidade], em que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”, afirmou.
O Princípio da Fraternidade responsabiliza cada indivíduo socialmente como membro da comunidade que deve ter entre suas opções de vida não apenas o seu próprio bem, mas o bem comum que efetivará dos Direitos Fundamentais.
Assim, a fraternidade coloca-se como um princípio que objetiva a busca do meio termo entre os direitos individuais e os direitos coletivos. Busca, então, harmonizar os diferentes pontos de vista de cada ser humano em uma sociedade plural e solidária.
Inspeções na unidade prisional e a resolução CIDH de 2018
Importante ressaltar que, a unidade prisional objeto do recurso sofreu diversas inspeções realizadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), a partir de denúncia feita pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro sobre a situação degradante e desumana em que os presos se encontravam.
Essas inspeções culminaram na edição da Resolução CIDH de 22 de novembro de 2018, que proibiu o ingresso de novos presos na unidade e determinou o cômputo em dobro de cada dia de privação de liberdade cumprido no local – salvo para os casos de crimes contra a vida ou a integridade física, e de crimes sexuais.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) aplicou a contagem em dobro apenas para o período de cumprimento de pena posterior à data em que o Brasil foi notificado formalmente da resolução da CIDH, porque a resolução não faz referência expressa ao termo inicial da determinação.
Após a decisão liminar do ministro Reynaldo, o MPRJ recorreu para que esse entendimento fosse restabelecido, sob o argumento de que a decisão da CIDH teria a natureza de medida cautelar provisória, motivo que impediria a produção de efeitos retroativos. Ele sustentou essa tese no fato de a resolução mencionada estabelecer prazos para o seu cumprimento.
A eficácia vinculante da decisão da CIDH
A partir do Decreto 4.463/2002, o Brasil reconheceu a competência da CIDH em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), aprovada em 1969.
Desta forma, as sentenças da CIDH são vinculantes para as partes processuais e todos os órgãos e poderes internos do país encontram-se obrigados a cumprir a sentença.
O ministro Reynaldo Soares ponderou que, ao aplicarem a resolução apenas a partir da notificação oficial feita ao Brasil, as instâncias anteriores deixaram de cumpri-la, pois as más condições do presídio, que motivaram a determinação da CIDH, já existiam antes de sua publicação.
No voto, o relator registrou que o MPRJ sustenta a natureza cautelar da medida, que limita os efeitos das obrigações decorrentes da resolução da CIDH para o futuro, mas aponta “para a necessidade de celeridade na adoção dos meios de seu cumprimento, tendo em vista, inclusive, a gravidade constatada das peculiaridades do caso”.
O ministro ainda destacou que, por princípio interpretativo das convenções sobre direitos humanos, é permitido ao Estado-parte ampliar a proteção conferida por elas.
Assim sendo, as sentenças da CIDH devem ser interpretadas da maneira mais favorável possível para quem teve seus direitos violados.
Por isso, você que já atua na execução penal, deve observar se é o caso de invocar a decisão vinculante no caso concreto, diante das peculiaridades dele serem favoráveis a esta medida.
Além disso, o relator ressaltou que as autoridades locais devem observar os efeitos das disposições da sentença internacional e adequar sua estrutura interna “para garantir o cumprimento total de suas obrigações frente à comunidade internacional”, no intuito de diminuir violações e abreviar as demandas internacionais.
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